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sábado, 23 de novembro de 2013

Edição 155 – Outubro/2013
Opinião
Participação Popular: difícil com ela, pior sem ela


Participação popular é um elemento essencial para se entender a democracia brasileira. Não há como falar em democracia apenas se referindo a sistemas políticos que respeitam regras eleitorais justas e claras. A democracia se constrói com participação popular e equidade social. Sem esses dois elementos, somados às eleições limpas, não se pode falar em democracia. O local privilegiado de construção da participação popular é a gestão pública municipal. Nosso direito cidadão e nossa obrigação cívica de participar da gestão pública começa em Brumadinho, nossa terra, nosso território, nossa morada, nosso lar.
A tarefa de fazer avançar a democracia participativa, tanto por parte da gestão pública quanto da sociedade, torna-se cada vez mais complexa à medida que a participação popular avança. Se antes o Estado brasileiro, centralizando suas políticas em Brasília, tornava a gestão local um mero espaço reprodutor das decisões centrais, agora gestores e funcionários públicos e sociedade civil precisam dar conta de demandas, interesses, desejos e vontades distintas que emergem com a liberdade que o ambiente participativo estimula. E nessa disputa entre grupos com distintos interesses, atender a alguns, geralmente os mais poderosos e influentes, é acentuar a desigualdade, minando a própria democracia, ao passo que querer agradar a todos pode levar ao esfacelamento das políticas públicas, fazendo-a atender a tudo e todos e não atender ao interesse público. O difícil equilíbrio entre distintos interesses e desejos é o que Alexis de Tocqueville chamou de interesse bem compreendido, o sedimento de uma verdadeira democracia. Em Brumadinho, qual o caráter que a participação popular tem assumido?
Participação popular é um processo de gestão pública essencial para a democracia, mas de difícil implementação. Dialogar com um cidadão pouco preparado pode trazer problemas. Não estou falando dos funcionários públicos mal intencionados, mas dos bem intencionados, que muitas vezes desistem de dialogar com o público e passam a orientar o cidadão a fazer isso e aquilo, como se isso fosse o mais adequado para ele naquela situação. Quem não já presenciou isso na prestação de serviços públicos, principalmente com pessoas humildes e pouca instrução formal? Esse é o caminho para a participação e o diálogo com o cidadão se tornarem assistencialismo e paternalismo. Por isso é que a democracia só avança e se sedimenta quando parcelas crescentes da população se sentem senhoras de seu direito e não assistidas por funcionários e gestores públicos bem intencionados, bonzinhos e carismáticos.
Participação popular dá trabalho e pode virar "assembleísmo", ou seja, formar-se sempre uma assembleia ou comissão para se discutir as ideias e propostas de ação. Assembleias nas quais os participantes não têm poder deliberativo, apenas consultivo, como ainda acontecem com alguns conselhos de políticas públicas, podem se tornar espaço de tudo discutir, à exaustão, e nada realizar, pois os que realmente têm poder de fazer acontecer as decisões no interior da máquina pública pouco participam e quando o fazem, o fazem com soberba e desprezo pelos demais. Por isso é que muitos dizem que quando se quer matar uma ideia de mudança no setor público, basta criar um grupo de trabalho para discuti-la.
Grupos conservadores sempre estão à sua espreita, munidos de qualquer tipo de argumento para reduzi-la ou mesmo eliminá-la. Desde chamar o povo de povinho até dizer que só quando o povo for educado poderá efetivamente participar só serve para alocar poder sempre para os mesmos. Esses mesmos se acham melhores e mais educados, mas na verdade, são piores e os mais mal educados, pois falta a eles o princípio básico da vida em comunidade, a humildade, o respeito pelos outros e o compromisso com a terra, a comunidade que os ensinou a ser pessoas, que os acolhe e dá identidade às suas vidas.
Por tudo isso é que, infelizmente, a frase de Renato Boschi ainda está muito viva na democracia brasileira: "as práticas de governança e participação podem se constituir em alternativas fadadas ao insucesso para os que dela mais necessitam: os pobres e os destituídos de recursos (...) podem terminar por se constituir em um mecanismo seletivo de conferir aos ricos a política, aos pobres o mutirão, a quem pode, o poder, a quem não pode, a participação".
E você, querido leitor, vai conquistar seu direito de participação com o peito cheio de dever moral que precisamos ter em relação à nossa terra, à cidade que aprendemos a chamar de terra natal? Ou deixará que outros simulem processos participativos para colocar na sua mente e nas suas palavras ideias que interessam mais a eles do que ao interesse público?

Armindo dos Santos de Sousa Teodósio (Téo)
Professor do Programa de Pós-Graduação em Administração da PUC Minas


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