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quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Edição 204 – Novembro 2017
Bernardo Paz é condenado a mais de 9 anos por crime de lavagem de dinheiro
Sentença considerou que Criador de Inhotim utilizou artifícios, como a pulverização de movimentações financeiras entre as empresas de seu grupo, para lavar dinheiro proveniente da sonegação de contribuições previdenciárias


O Ministério Público Federal em Minas Gerais (MPF/MG) obteve a condenação do empresário Bernardo de Mello Paz e de sua irmã Virgínia de Mello Paz pelo crime de lavagem de dinheiro. Bernardo Paz foi condenado a 9 anos e 3 meses de prisão, em regime fechado; Virgínia, a 5 anos e 3 meses, em regime semiaberto.
Até 2010, o empresário era o proprietário do conglomerado Itaminas, composto por 29 empresas, a maioria na área de mineração e siderurgia. Naquele ano, o grupo foi vendido para uma empresa estrangeira.
Na denúncia oferecida no ano de 2013, cujo teor foi confirmado agora por sentença, o MPF afirmou que, entre 2007 e 2008, Bernardo e Virgínia Paz praticaram lavagem de ativos de suas empresas, dissimulando a origem e a natureza de recursos provenientes da sonegação de contribuições previdenciárias.
Conforme reconheceu a sentença a partir da documentação encaminhada pela Receita Federal e pela Procuradoria da Fazenda Nacional, o comportamento habitual de Bernardo Paz era o de "não cumprimento de obrigações fiscais e previdenciárias, revelando completo descaso das empresas em relação ao Fisco", com dívidas milionárias inscritas em dívida ativa, algumas já em fase de execução à época dos fatos.
Naquele período, segundo relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), do Ministério da Fazenda, foram detectadas movimentações irregulares, efetuadas especialmente pela BMP [Bernardo de Mello Paz] Participação e Empreendimentos – que era a controladora de todas as empresas que compunham o grupo Itaminas - e pela Horizontes.

Ilhas Virgens 

A Horizontes foi criada por Bernardo Paz com a finalidade de manter o Instituto Cultural Inhotim a partir de doações de suas outras empresas. Ocorre que a maior acionista da Horizontes, a Vine Hill Financial Corp, com sede nas Ilhas Virgens Britânicas, é uma empresa cujo endereço é o mesmo de diversas pessoas físicas e jurídicas acusadas de cometer crimes de lavagem de dinheiro.
Entre 2007 e 2008, a Horizontes recebeu o valor total de US$ 98,5 milhões de um fundo denominado Flamingo Investiment Fund, sediado nas Ilhas Cayman, outro paraíso fiscal.
Esses valores foram recebidos a título de doações e/ou empréstimos para o Instituto Cultural Inhotim, mas logo depois foram repassados, de diversas formas, "para o pagamento dos mais variados compromissos de empresas de propriedade de Bernardo de Mello Paz, tendo sido constatados diversos saques em espécie nas contas do grupo sem que se pudesse identificar o destino final dos valores", relata a sentença, acrescentando que "ficou claramente constatada existência de enorme confusão patrimonial e contábil entre as diversas empresas do Grupo Itaminas. Tanto Bernardo de Mello Paz, (...) quanto as testemunhas de defesa, por diversas vezes, afirmaram que todos os compromissos das empresas do grupo eram pagos com dinheiro oriundo da BMP Participação, pois evitava-se a utilização de contas correntes em nome próprio das pessoas jurídicas do Grupo, a fim de impedir eventual bloqueio judicial de valores devido ao não pagamento de obrigações fiscais, trabalhistas etc.".
Ainda segundo a sentença, ficou demonstrado que "a conta da Horizontes S/C não visava unicamente à manutenção do Instituto Cultural Inhotim, mas também servia de conta intermediária para diversos repasses às empresas do Grupo Itaminas".

Operações dissimuladas e sonegação de impostos

Com relação aos saques em espécie, na boca do caixa, foi apurado que as pessoas que sacaram os valores o fizeram a pedido de Bernardo Paz. Para o Juízo Federal, tais operações, "longe de configurarem uma simples retirada em espécie, foram verdadeiras operações financeiras dissimuladas, visando induzir a erro no tocante ao destino final dos valores, já que o beneficiário de tudo foi Bernardo de Mello Paz".
O Juízo Federal reconheceu que a sistemática era a prática de sonegação previdenciária, "seguida da ocultação e dissimulação dos valores, que retornavam através de transferências oriundas de paraíso fiscal à conta da Horizontes, que, por sua vez, repassava à BMP Participação, e esta última pulverizava os valores entre todas as empresas do Grupo Itaminas, inclusive sendo destinadas a repasses em espécie a Bernardo de Mello Paz".
Com relação ao empresário, a sentença registra que, "na qualidade de principal acionista e proprietário das empresas do Grupo Itaminas, era a pessoa que possuía o poder decisório e o total controle sobre os negócios das empresas do grupo".
Também não há dúvida da culpa de Virgínia Paz na dissimulação dos valores vindos do exterior. Lembrando que "não se pode conceber que uma movimentação financeira, a qual chegou a 1.419% acima da renda declarada, tenha passado desapercebidamente pela ré", o Juízo da 4ª Vara Federal considerou que “(...) ainda que possuindo participação societária menor, caberia à ré tomar conhecimento, regularmente, da situação da empresa em que é sócia. Além disso, a ré prestou-se a efetuar todos os pagamentos relativos ao Museu de Inhotim em sua conta pessoal, sabendo que tais transações eram oriundas da empresa Horizontes Ltda, chamando para si a confusão patrimonial e ajudando na dispersão dos ativos”.

Recurso

O MPF também havia denunciado Gustavo Luis Kahey Machado, Marco Túlio Kahey Machado e Leila Kahey Machado, responsáveis na época pelo Posto Divino Padrão Ltda, pessoa jurídica que também recebeu dinheiro das empresas de Bernardo Paz.
A Justiça Federal, no entanto, absolveu os acusados, por considerar que não houve comprovação de que as transferências efetuadas entre a BMP e o Posto Divino Padrão, embora vultosas, tenham tido conexão com a lavagem de dinheiro proveniente da sonegação previdenciária.
O MPF recorreu da absolvição, alegando que o posto era um dos maiores beneficiários de depósitos provenientes da BMP, e que, de acordo com o Coaf, apresentou movimentação financeira incompatível com suas atividades e negócios normais. Gustavo e seu irmão Marco Túlio teriam aceito cheques, em elevadíssimos valores, de caminhoneiros a serviço das siderúrgicas do Grupo Itaminas, os quais eram descontados, com o pagamento em espécie de valores a título de "troco".
O Ministério Público Federal também pediu o aumento das penas impostas a Bernardo e Virgínia, pois “os sentenciados tinham plena consciência da ilicitude de seus atos, caracterizados por grande reprovabilidade, especialmente pelo meio e pela repercussão que teve o crime, pela complexidade e alto vulto dos valores movimentados”.
As informações são da Assessoria de Comunicação Social do Ministério Público Federal em Minas Gerais

 Outro lado

O advogado de Bernardo e Virgínia Paz, Marcelo Leonardo, afirmou que todas as operações financeiras são regulares. Em entrevista à TV Globo, Leonardo disse que “eles são inocentes e a decisão é injusta. Esperamos que seja revertida no Tribunal Regional Federal em Brasília”.
Segundo o advogado, as operações não envolvem o Inhotim e tem relação somente com empresas, de outras áreas, das quais Bernardo era sócio. Além disso, para Leonardo, a condenação de Bárbara é ‘absurda’ pois ela nunca foi gestora das empresas citadas. Bernardo e Bárbara recorrem em liberdade.

Histórico

Não é a primeira vez que Bernardo paz é acusado de cometer esse tipo de crime. O Jornal de fato, em sua edição de nº 106, setembro/2009 publicou a matéria “Inhotim – Bernardo Paz sob suspeita”. À época, Bernardo Paz era acusado de cometer “uma série de irregularidades”, O jornal FSP acusava “Bernardo de vários ilícitos, como a acusação de sonegador de impostos, devedor do Estado, réu em ação penal, fraudador, de usar de laranjas em seus negócios, operar com empresas fantasmas, ter dinheiro em paraísos fiscais.” Ainda segundo a Folha, Inhotim valia, em 2009, R$ 365 milhões, mas esse patrimônio teria relações com as operações com empresas fantasmas e dinheiro de paraísos fiscais, dentre outras acusações.

Benefício do Governo Aécio Neves

O Jornal de fato publicou ainda as acusações de que Paz teria sido “beneficiado pelo Governo de Aécio Neves (do PSDB, cujo presidente mineiro, Nárcio Rodrigues, deputado federal apoiado por Inhotim e fora o candidato mais votado em Brumadinho). O jornal de referiu aos R$ 20 milhões para a construção de um centro de convenções.
Na época, o Jornal de fato postou uma enquete em seu blog sobre a questão: 40% dos leitores opinaram que Bernardo seria “totalmente culpado das acusações”; 20% dos leitores opinaram que seria “parcialmente culpado das acusações”; 40% não sabiam opinar. Ninguém opinou na opção: “É totalmente inocente”.

Já em março de 2013, na edição de nº 148, o Jornal de fato publicou matéria intitulada “Mistérios rondam terreno do Minha Casa, Minha Vida”. Os fatos envolviam o então governo Nenen da ASA (PV), Bernardo Paz, o ex-vereador João Moreira e um terreno que seria para o programa habitacional, que nunca saiu do papel. Ex moradores do povoado de Inhotim, cujos nomes apareciam em documentos cartoriais negavam veementemente terem participado das negociações com o proprietário de Inhotim como elas constavam ali. 

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