Edição 163 –
Junho/2014
Opinião
Há uma mudança de compreensão
cultural sobre o papel das empresas junto à sociedade atualmente. Cada vez
mais, não se espera das empresas apenas o mero exercício de responsabilidade
fiscal e boa gestão interna dos negócios através do ciclo investimento, geração
de emprego e salários, distribuição de lucros e pagamento de impostos. Isso não
constitui virtude de nenhuma empresa, mas sim obrigação legal, moral e cidadã.
Ou seja, as empresas não fazem nenhum favor às cidades em que atuam, como na
nossa querida e sofrida Brumadinho, ao pagarem impostos corretamente,
oferecerem condições adequadas de trabalho, oferecerem salários justos e
remunerarem adequadamente seus proprietários pelo lucro gerado.
Empresas que desejam se manter
operantes e competitivas no futuro devem atender à crescente e legítima
expectativa das cidades em que atuam de se envolverem e apoiarem as comunidades
na solução dos problemas sociais e ambientais que as afligem, independentemente
dessas empresas terem ou não gerado esses mesmos problemas. E em Brumadinho não
é diferente.
As expectativas com relação aos
impactos sociais e ambientais (e não apenas de geração de emprego e renda) são
grandes em relação aos diferentes empreendimentos de grande porte que operam em
Brumadinho, seja no campo tradicional da mineração, seja no emergente turismo
cultural ou mesmo na geração de águas para a Região Metropolitana de Belo
Horizonte. Paira sobre essas empresas a justa expectativa dos brumadinenses de
que elas também sejam corresponsáveis pela solução dos problemas sociais e
ambientais que afligem nossa cidade.
Com o aumento da complexidade das
sociedades e sua interligação pelas mídias digitais, grupos sociais com
expectativas, interesses e direitos junto às empresas multiplicaram-se para
muito além dos públicos tradicionais ligados ao negócio, como consumidores,
trabalhadores e comunidades diretamente afetadas pelas atividades das empresas.
Hoje em dia, através de mídias sociais como Face book, Twitter e YouTube,
dentre outras, temos informações sobre diferentes benefícios e malefícios
produzidos pelas empresas em diferentes cidades do mundo, mesmo que sejam
pequenos municípios como Brumadinho, que para os desavisados (e alienados) de plantão,
não teriam nenhum poder de pressão sobre as grandes empresas. Ledo engano, pois
as lutas sociais e ambientais não são apenas lutas de um lugar, de uma cidade
como Brumadinho, mas de todo o planeta. E nessas lutas, comunidades locais
recebem apoio de outras comunidades, solidárias a ela pelos mesmos problemas
vivenciados, e ONGs de diferentes partes do mundo, muitas delas com grande
capacidade de pressão junto a governos e forte penetração na mídia.
Sendo assim, cabe repensar as
práticas empresariais no sentido de avaliá-las não apenas em termos de
distribuição de riquezas, mas considerar se a pujança econômica que geram
também é acompanhada de melhor distribuição de renda (ou redução da
desigualdade social) na cidade em que operam, por avanços também na capacidade
da sociedade se organizar para resolver seus problemas sociais e ambientais e
promover a preservação dos patrimônios naturais e culturais.
Isso tudo pode parecer muito
complexo e distante da realidade de Brumadinho. No entanto, não é. Nossa cidade
já passou por diferentes ciclos de expansão econômica, seguidos de todos os
benefícios e malefícios que a ampliação das empresas, sobretudo as de grande
porte, pode gerar para as cidades em que operam. Já se foi o tempo que os
brumadinenses acreditavam que as mineradoras ou o turismo cultural trariam
apenas prosperidade à nossa cidade. Expansão urbana desenfreada, degradação
ambiental, carestia nos aluguéis e nos itens de consumo diário (padaria,
supermercado, ...), trânsito caótico, invasão de empresários de fora, bons
empregos com altos salários para trabalhadores contratados fora de Brumadinho e
empregos medianos e precários com baixos salários para a população local são
alguns dos legados questionáveis dos grandes empreendimentos que operam em nossa
cidade.
Mas, esse cenário pode ser alterado,
desde que não cruzemos os braços e tenhamos a altivez de espírito de acreditar
que Brumadinho não apenas abriga as melhores jazidas do mais puro minério de
ferro de Minas ou o maior empreendimento cultural do mundo, mas também abriga
um lugar com gente tão grande quanto esses empreendimentos. Eu acredito nisso,
querido leitor e leitora. Mas para que sejamos realmente grandes, precisamos,
como nos convida a música do Rappa, ter em mente que não podemos “sentar na
poltrona no dia de domingo”. É preciso acreditar em uma Brumadinho melhor, mais
justa e sustentável, e efetivamente agir de forma coletiva nessa direção, não
só porque grandes empreendimentos aqui vieram fazer morada, mas porque aqui
moram pessoas que sempre foram maiores que quaisquer interesses, estranhos à
nossa cidade, cujos impactos sobre Brumadinho são questionáveis.
Armindo dos Santos de Sousa Teodósio (Téo) é Professor do
Programa de Pós-Graduação em Administração da PUC Minas
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