Edição 127-Agosto/2011
Viva a liberdade de Imprensa
Nenen da ASA processa de fato. E perde.
O prefeito Nenen da ASA (PV) processou o jornal de fato e seu Editor, Reinaldo Fernandes. Segundo Nenen da ASA, o Jornal o teria caluniado e difamado ao publicar, na edição de nº 121, fev/2011, notícias sobre denúncias apresentadas na Câmara Municipal de Brumadinho por Cláudio Teixeira, seu ex-aliado político. O de fato publicou as denúncias que acusavam o prefeito de uso de caixa dois na campanha eleitoral; compra de votos e, ainda, de ter escrito uma carta anônima difamando cidadãos brumadinenses, inclusive juíza, policiais, vereadores e outras autoridades. Além de noticiar as denúncias, o Editorial da edição foi a respeito do assunto.
A Justiça julgou como improcedente o pedido do prefeito. Além do jornal de fato – impresso e on line - publicaram a notícia pelo menos outros dois jornais de Brumadinho, e, ainda, o jornal HOJE EM DIA, um jornal de Mantena (MG), além de ter sido postado, no site youtube, um vídeo em que as denúncias eram apresentadas no Legislativo. Veja abaixo a sentença:
“Dispensado o relatório nos termos do Art. 38 da lei 9099/95.
Decido.
Tratam os autos de pedido de reparação de danos decorrentes de danos à imagem e à honra do autor.
(...)
Sendo as publicações com os termos descritos na inicial tidos como verdadeiros, cabe investigar se no caso se configuraram os requisitos da reparação, com a ocorrência de ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência com violação de direito, causadora de dano.
Segundo a inicial o jornal trouxe a versão não verdadeira de “Caixa 2 na campanha de Neném da ASA” q
que foi motivada por ex-funcionário da Câmara Municipal de Brumadinho e que se trata de afirmação sabidamente falsa, pois o segundo Réu foi candidato a vereador tendo pleno conhecimento de que as contas de campanha do Autor foram aprovadas pela Justiça Eleitoral. Consta também do Jornal considerações pessoais de que “quanto às acusações ao Prefeito, quem acompanhou a campanha eleitoral de Brumadinho com um mínimo de atenção já sabia que a existência de caixa dois na campanha de Neném da ASA (PV) era bem possível.”
A manifestação de pensamento e ideias é livre (art. 5º, IV e IX, CR). Contudo, a liberdade de expressão não é absoluta, de forma que não pode significar a ofensa do direito à imagem e à honra (Art. 5º, V, CR), acarretando a responsabilização civil e criminal em caso de violação destes direitos.
A matéria publicada, conforme acentuado pela própria inicial, se baseia em informações de terceira pessoa, tendo os Requeridos dado publicidade aos fatos, direito assegurado por lei, não se constando na comunicação excesso considerado como abuso do direito de informar (art. 5, IX, CR), muito menos restando comprovada a ciência por parte dos Requeridos da falsidade de tais informações, especialmente quando trazidas por ex-funcionário do Poder Legislativo municipal a quem se supõe ciência dos fatos.
Segundo STF na redação que coube ao Relator Min. Celso de Mello “ninguém ignora que, no contexto de uma sociedade fundada em bases democráticas, mostra-se intolerável a repressão estatal ao pensamento, ainda mais quando a crítica – por mais dura que seja – revele-se inspirada pelo interesse coletivo e decorra da prática legítima, como sucede na espécie, de uma liberdade pública de extração eminentemente constitucional (CF, art. 5º, IV, c/c o art. 220). Não se pode desconhecer que a liberdade de imprensa, enquanto projeção da liberdade de manifestação de pensamento e de comunicação, reveste-se de conteúdo abrangente, por compreender, dentre outras prerrogativas relevantes que lhe são inerentes, (a) o direito de informar, (b) o direito de buscar a informação, (c) o direito de opinar e (d) o direito de criticar. A crítica jornalística, desse modo, traduz direito impregnado de qualificação constitucional, plenamente oponível aos que exercem qualquer atividade de interesse da coletividade em geral, pios o interesse social, que legitima o direito de criticar, sobrepõe-se a eventuais suscetibilidades que possam revelar as pessoas públicas. (...) É importante acentuar, bem por isso, que não caracterizará hipótese de responsabilidade civil a publicação de matéria jornalística cujo conteúdo divulgar observações em caráter mordaz ou irônico ou, então, veicular opiniões em tom de crítica severa, dura ou, até, impiedosa, ainda mais se a pessoa a quem tais observações forem dirigidas ostentar a condição de figura pública, investida, ou não, de autoridade governamental, pois, em tal contexto, a liberdade de crítica qualifica-se como verdadeira excludente anímica, apta a afastar o intuito doloso de ofender. Com efeito, a exposição de fatos e a veiculação de conceitos, utilizadas como elementos materializadores de prática concreta de direito à crítica, descaracterizam o animus injuriandi vel diffamandi, legitimando, assim, em plenitude, o exercício dessa particular expressão da liberdade de imprensa. (...) É preciso advertir, bem por isso, notadamente quando se busca promover, como no caso, a repressão à crítica jornalística, mediante condenação judicial ao pagamento de indenização civil, que o Estado, inclusive o Judiciário – não dispõe de poder algum sobre a palavra, sobre as ideias e sobre as convicções manifestadas pelos profissionais dos meios de comunicação social.” (AI 505.595, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 11-11-2009, DJE de 23-11-2009.)
Dessa forma, a publicidade dada aos fatos não se caracteriza ato ilícito, pois noticia fato descrito por terceiro e que em sua veiculação não sofreu inovação propositada de cunho depreciativo, não podendo ser considerado excesso a opinião sobre os fatos, garantia constitucional.
Inclusive, diante da estreita ligação entre a atividade jornalística e o direito de expressão, se atribui à função jornalística maiores garantias quanto ao poder de regulação Estatal, pois “o jornalismo é uma profissão diferenciada por sua estreita veiculação ao pleno exercício das liberdades de expressão e de informação. O jornalismo é a própria manifestação e difusão do pensamento e da informação de forma contínua, profissional e remunerada. (...) O exercício do poder de polícia do Estado é vedado nesse campo em que imperam as liberdades de expressão e de informação. Jurisprudência do STF: Representação 930, Rel. p/ o ac. Rel. Min. Rodrigues Alckim, DJ de 2-9-1977.” (RE 511.961, Re. Min. Gilmar Mendes, Julgamento em 17-6-2009. Plenário, DJE de 13-11-2009.)
Neste mesmo sentido:
“(...) A presente ordem constitucional brasileira autoriza a formulação do juízo de que o caminho mais curto entre a verdade sobre a conduta dos detentores do Poder e o conhecimento do público em geral é a liberdade de imprensa. A traduzir, então, a ideia-força de que abrir mão da liberdade de imprensa é renunciar ao conhecimento geral das coisas do Poder, seja ele político, econômico, militar ou religioso. 4. A Magna Carta Republicana destinou à imprensa o direito de controlar e revelar as coisas respeitantes à vida do Estado e da própria sociedade. A imprensa como a mais avançada sentinela das liberdades públicas, como alternativa à explicação ou versão estatal de tudo que possa repercutir no seio da sociedade e como garantido espaço de irrupção do pensamento crítico em qualquer situação ou contingência. Os jornalistas, a seu turno, com o mais desanuviado olhar sobre o nosso cotidiano existencial e os recônditos do Poder, enquanto profissionais do comentário crítico. Pensamento crítico que é parte integrante da informação plena e fidedigna. (...)” STF – REFERENDO EM MED. CAUT.EM ADI N. 4.451-DF – RELATOR: MIN. AYRES BRITTO – INFORMATIVO 633 – 03/08/2011).
ANTE O EXPOSTO, JULGO IMPROCEDENTE OS PEDIDOS FORMULADOS POR AVAMAR DE MELO BARCELOS CONTRA SOCIEDADE ALTERNATIVA BRUMADINENSE DE IMPRENSA E REINALDO DA SILVA FERNANDES, extinguindo o feito nos termos do Art. 269, I do CPC.
(...)
P.R.I.
Brumadinho, 10 de agosto de 2011.
Paulo Sérgio Ferreira
Juiz de Direito – 2ª Vara”
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