Edição 168 – Outubro
Governo Municipal é denunciado por descumprimento
de leis e supostos atos de corrupção
Recusa em prestar informações à Câmara,
gratificações para contratados, gratificações que podem estar sendo pagas sem a
prestação do serviço, horas extras suspeitas podem ser verificadas na
documentação apresentada na denúncia
Vereadores livram prefeito que terá que
enfrentar a Justiça
O Município viveu
clima tenso nesse mês de novembro. No dia 13, a Câmara Municipal recebeu
denúncia formal contra o prefeito Brandão, pedindo abertura de Comissão
Processante e consequente cassação do mandado do prefeito do PSDB.
Surpreendidos com a denúncia e sem ter tido acesso a ela antes da reunião do
Plenário, os vereadores fizeram um acordo depois que o vereador Reinaldo
Fernandes (PT) apresentou um Requerimento solicitando o adiamento da discussão.
O Vereador defendeu que era preciso que os edis lessem antes os documentos para
poderem se posicionar.
As denúncias
No dia seguinte,
os documentos foram distribuídos aos vereadores, quando puderam verificar as
denúncias apresentadas por Guilherme Augusto Braga Morais.
O documento fazia
duas denúncias, ambas acompanhadas de documentação. A primeira dizia respeito
ao fato de o Prefeito não responder às deliberações de pedidos de informações
votadas e aprovadas pelo Plenário da Câmara Municipal. À denúncia, primeiro com
53 páginas e, depois, com novos documentos, 89 páginas, foram anexados 11
(onze) Requerimentos aprovados pelos vereadores. Um deles era de autoria da
vereadora Renata Parreiras (PSB), seis eram da autoria de Alessandra de
Oliveira (PPS) e quatro de Reinaldo Fernandes (PT). Eram requerimentos aprovados
desde 30 de janeiro de 2013, e que não obtiveram respostas do Prefeito, o que
constitui-se ilegalidade nos termos do Decreto-lei federal 201/67, mesma lei em
que foi baseada a cassação do ex-prefeito Cândido Amabis Neto, o Gibiu. Os
Requerimentos solicitavam informações sobre imóveis cedidos a particulares pela
Prefeitura, informações sobre cargos de servidores, sobre terrenos do Município
cedidos a particulares pela Prefeitura, pagamento de indenizações e sobre o
contrato do Município com a COPASA e as razões pelas quais a Administração não
cumpria leis, como a que acabou com a Taxa de Esgoto em Brumadinho. Alguns
dos Requerimentos foram aprovados uma vez, e, diante da recusa da Administração
de responder, foram novamente aprovados por todos os vereadores, mas mesmo assim o
Prefeito recusou-se a enviar as informações. Sobre a COPASA, por exemplo, foram
aprovados pedidos de informações duas vezes, sendo uma delas em 27 de fevereiro
de 2014, outra em 14 de agosto, ambos sem resposta. Sobre Folha de Pagamento dos
servidores, foi aprovado um mesmo Requerimento em 14 de agosto e 8 de outubro e
outros também sobre Folha de Pagamento em 21 de fevereiro de 2013, 13 de
fevereiro de 2014, e 9 de outubro de 2014.
Tanto o Regimento
Interno da Câmara Municipal quanto a Lei Orgânica de Brumadinho, e ainda as
Constituições Estadual e Federal, e, agora, a Lei Federal nº 12.527, de
18/11/2011, garantem aos vereadores o acesso a quaisquer informações públicas e
cabe ao prefeito o dever legal de respeitar essas leis. Mesmo assim, a
Prefeitura recusou-se a prestar as informações à Câmara de Vereadores.
Gratificações
ilegais
A outra parte da
denúncia apresentada dizia respeito às gratificações de função. De acordo com o
§ 1º do art. 96 da Lei Complementar Municipal 39/2004, só servidores efetivos,
se estiverem prestando outros serviços que não os de seu cargo, poderão ser
gratificados. Diz o § 1º: “Art. 96. ...
§ 1º. A gratificação por encargos eventuais poderá
ser concedida, por tempo determinado,
ao servidor do Quadro Permanente de
Pessoal, quando, por necessidade da administração, o mesmo assumir atribuições que não se incluam
em seu desempenho regular, comprovada a experiência, habilitação ou
formação para o desempenho da função.” O parágrafo segundo diz que o pagamento
“dependerá de ato prévia e devidamente motivado”
Segundo a denúncia, o Prefeito deu “prejuízo ao
erário, com o consequente enriquecimento ilícito de alguns servidores, ao
conceder gratificação (...) beneficiando servidores que não são do quadro
Permanente da Administração”.
Como diz o texto da lei, a gratificação a) “deve
ser por tempo determinado;” b) “deve ser concedida apenas ao quadro permanente
de pessoal”; e c) “somente quando [o servidor] assumir atribuições que não se
incluam em seu desempenho regular”, como consta da página 87 da denúncia assinada
por Guilherme Morais.
O denunciante defendeu que “contratados a título
precário, com contrato administrativo, para um cargo específico, passa a
receber a gratificação sem qualquer justificativa plausível”.
“No mesmo sentido,
há comissionados – que obviamente não são do Quadro Permanente – que recebem a
gratificação”, continua o denunciante. “lado outro, a legislação estabelece que
a gratificação deve ter prazo determinado. Há beneficiados – amigos do prefeito
– que recebem a gratificação há mais de um ano”, continua.
Infração
político-administrativa
O denunciante defendeu que as práticas do
prefeito Brandão (PSDB) são tipificadas no Decreto-Lei 201/67 e transcreveu o
art. 4º, caput e incisos III, VII e X:
“Art. 4º São infrações político-administrativas
dos Prefeitos Municipais sujeitas ao julgamento pela Câmara dos Vereadores e
sancionadas com a cassação do mandato:
III - Desatender, sem motivo justo, as
convocações ou os pedidos de informações da Câmara, quando feitos a tempo e em
forma regular;
VII - Praticar, contra expressa disposição
de lei, ato de sua competência ou omitir-se na sua prática;
X - Proceder de modo incompatível com a
dignidade e o decoro do cargo. “
No mesmo artigo, há ainda outros dois
incisos que o Denunciante poderia ter citado, que são os I e VIII, que vão na
mesma direção e se aplicariam às acusações:
“I - Impedir o funcionamento regular da
Câmara;
VIII - Omitir-se ou
negligenciar na defesa de bens, rendas, direitos ou interesses do Município
sujeito à administração da Prefeitura”.
“Assim sendo, o
Denunciado, ao não responder os requerimentos da Câmara, de uma só vez,
praticou conduta descrita nos incisos II e X, do art. 4º, do Decreto lei
201/67. Por sua vez, ao conceder gratificação a servidores que não são do
quadro permanente, cometeu o Prefeito a conduta tipificada no inciso VII, do
art. 4º, do Decreto lei 201/67”, diz o Denunciante à pagina 84.
Por fim o denunciante
fez os pedidos de “recebimento da denúncia”, “instauração de Comissão
processante” e que “ao final, condenado o Denunciado à perda de seu mandato”
(pág. 84.)
Dezenas de
gratificações para cargos que não são do Quadro Permanente
O jornal de fato
teve acesso à Denúncia e às 62 (sessenta e duas) páginas da Folha de Pagamento
da Prefeitura Municipal de Brumadinho que estão anexadas a ela. Parte dela,
referente ao mês de outubro de 2013; oura parte, de janeiro deste ano de 2014.
O jornal analisou a documentação e constatou que consta da Folha pagamentos a
servidores que não são do Quadro Permanente, ou seja, não são concursados, são
apenas contratados pelo prefeito Antônio Brandão (PSDB) a partir de 1º de
janeiro de 2013, quando ele tomou posse. São milhares de reais pagos a esses
servidores indevidamente.
Segundo a análise
feita pelo jornal, são 39 casos de pagamentos de gratificações, excetuando os
casos de professores que recebem legalmente gratificação pela função de diretor
(a) ou Vice ou Coordenador de Escolas. O número de 39 já é, por si mesmo,
bastante preocupante. Pagamento de gratificação não é algo muito comum porque
trata-se de situações excepcionais. São os casos de tarefas que só precisam ser
feitas de vez em quando, são “encargos eventuais”, como diz o texto da Lei 39/2004. Um exemplo é a
Comissão de Licitações da Câmara Municipal. Como as licitações são poucas,
gratifica-se um servidor para participar da Comissão, ao invés de contratar um
novo servidor para um cargo que tem muito pouco serviço.
Dos 39 casos,
apenas 6 deles são de servidores do Quadro Permanente. Daí que todas as outras
33 gratificações são ilegais, já que a Lei é clara ao afirmar que a
gratificação “poderá ser
concedida, por tempo determinado,
ao servidor do Quadro Permanente de
Pessoal”.
Um caso que a Prefeitura
provavelmente não conseguirá explicar é o da “Analista da Administração” M. L.
L. O. – página 38 da denúncia. Ela tinha, em janeiro de 2014, antes do reajuste
de abril deste ano, salário base de R$ 2.714,00 e Gratificação de 1.628,00.
Acontece que M. L. L. O.
é a secretária de uma Secretária Municipal de Governo. Deve ser difícil
convencer alguém de que a servidora exerce outras atividades que não a de ser
recepcionista/secretária.
Gratificações suspeitas
Mesmo as 6 gratificações a “Servidor
do Quadro Permanente de Pessoal” são suspeitas. Exemplo disso é o “Agente
Condutor I”, E. N. B., documento à pagina 14. “Agente Condutor” na Prefeitura
significa “Motorista”. É de conhecimento até do senso comum que um motorista da
Prefeitura, quando não está dirigindo em direção a algum lugar, ou seja, quando
não está exercendo sua tarefa, fica à disposição de sua chefia, esperando uma
ordem para buscar ou levar alguém a algum lugar. Então é muito difícil de se
explicar que um motorista receba 85% a mais de seu salário como gratificação por
estar com algum outro “encargo eventual”
que não seja dirigir um veículo.
Outro exemplo é de outro motorista,
D. V. F., pág. 56, que também recebe 85% de gratificação por “encargo
eventual”.
Já a “Agente Administrativa” E. G.
S., pág. 54, tem salário de R$ 1.644,50 e gratificação de 75%, ou seja, R$
1.233,38, além de receber “prêmio” de R$ 493,35. Ora, de acordo com a lei
1.777/2010, Plano de Cargos e Carreiras
da Prefeitura, uma Agente Administrativa deve exercer “atividades burocráticas
e técnicas em administração, Arquivo, Digitação, Secretaria escolar, Elaboração
e revisão de Textos, Contabilidade, Tesouraria e Técnicas das áreas necessárias
à administração”. Ou seja, as atividades são tantas que fica quase impossível
que ela exerça atividades diferentes dessas.
Gratificações e Horas Extras
As gratificações supõem que o
servidor fará um trabalho “eventual”, que não é seu. Já Horas Extras
justificam-se pelo excesso de serviço: se o servidor não consegue executar tais
atividades nas suas horas de trabalho (geralmente 8), ele pode trabalhar e receber
eventualmente horas extras, até o limite de 2 por dia. Ou seja, para quem
trabalha 40 horas semanais, o máximo que conseguirá fazer, de acordo com a Lei,
é 10 horas por semana, no máximo 44 por mês, o que já seria muito suspeito, já
que as horas extras devem ser coisa “eventual”.
Curiosamente, R. J. A., pág. 2,
recebeu R$ 454,38 em horas Extras no mês de outubro de 2013, equivalente a
32,38% de seu salário mensal. Como ele é Agente Fiscal, tem carga horária de 40
horas semanais, 220 mensais, tem salário de aproximadamente R$ 6,38 por hora,
R$ 9,57 por hora extra. Para receber R$ 454,38, teria que fazer 47,47 horas
extras, ou seja, 2 horas durante 24 dias. Mas como ele não trabalha no sábado,
mesmo que fizesse 2 horas todos os dias, o que não é comum a um Agente Fiscal,
conseguiria fazer 46 horas no mês de outubro de 2013, que teve 23 dias úteis.
Mas, o m ais curioso é que R. J. A. recebeu também R$ 911,95 de gratificação.
Como ele teve que fazer horas extras todos os dias, sem exceção, no limite da
Lei, e ainda sobrou tempo para exercer “encargos eventuais”, ou, como reitera a
Lei 39/2004, “assumir atribuições que não se incluam em seu desempenho regular”
de Agente Fiscal?
A mesma curiosidade
acontece com M. C. M. – pág. 3 -, J. M. D. A., Agente Fiscal – pág. 6 -, R. O.
P. – pág. 1 -, D. H. M. S. – pág. 16 – e C. C. A. B. – pág. 18 - que
supostamente precisam de ficar depois de suas 8 horas diárias mas, ao mesmo
tempo, recebem de 20 a 85% de gratificação de função.
O caso do
Assistente Técnico II C. C. A. B. – pág. 18 - é o mais curioso, e a
Administração terá que dar explicações bem convincentes: C. C. A. B., contratado em
2/1/13, tem salário de R$ 1.488,10 e recebe mais metade desse salário em horas
extras. Sua carga horária é de 220 horas mensais, o que leva a crer que ele fez
73 horas extras no mês de outubro de 2013. Como o mês teve 23 dias úteis, ele
deveria ter feito mais de 3 horas extras por dia, o que é ilegal. E mesmo que
ele tivesse feito mais de 3 horas extras em todos os 23 dias do mês, ainda
recebeu R$ 1.116,08, 75% de seu salário base como “Gratificação de
Função”.
Servidores recebem
“Prêmio”
Alguns servidores
recebem um dinheiro que é chamado de “Prêmio”. São os casos do Agente
Administrativo W. L. C. – pág. 29 -, R. F. S. – pág. 33 -. H. R. R. – pág. 51 –
e E. G. S. – pág. 54. Os “prêmios” equivalem a 30% do salário base.
Nossa reportagem
pesquisou na Câmara Municipal e não encontrou nenhuma legislação que permita à
Administração o pagamento de “Prêmio” a servidores que não sejam do quadro da
Educação. O único “Prêmio” que existe na Legislação diz respeito a apenas 10%
do salário base – e não 30% - dos servidores da Educação. Para receber esse
prêmio, uma única vez por ano, o servidor não pode ter faltas durante o ano
anterior.
No caso do Agente
Administrativo III W. L. C., ele recebeu, ainda, nas férias de janeiro de 2014,
além das horas extras, gratificação de função e 1/3 de férias, o “Abono
Pecuniário”. Mas três verbas despertam curiosidade: 1/3 sobre férias no Mês
(521,66 reais), Abono Pecuniário (782,49), e “1/3 sobre Abono
Pecuniário”(260,63). A reportagem do de fato mostrou essa página da Folha de
Pagamento a um Gerente de Recursos Humanos e quis saber sua opinião. Ele
explicou que “Abono Pecuniário” e “1/3 sobre férias no Mês” é a mesma coisa e
que nunca ouvira falar em “1/3 sobre Abono pecuniário”, que isso não existe.
Segundo o que explicou à reportagem, “Abono Pecuniário” significa parte (1/3)
das férias vendidas e sobre essa parte não incide mais pagamento, por óbvio.
Seria o mesmo que 1/3 sobre 1/3, como realmente foi pago sobre o segundo 1/3
(R$ 782,49 : 3 = R$ 260,83). Ou, nas palavras do advogado trabalhista João
Batista Camargo Filho: “abono pecuniário é a conversão em dinheiro, de 1/3 (um
terço) dos dias de férias a que o empregado tem direito”. No caso, teriam sido
pagos duas vezes as férias vendidas e ainda mais R$ 260,83.
Salário de R$
10.183,25
Outro dado bastante
curioso que aparece à página 33 da denúncia de Guilherme Morais diz respeito a
uma Especialista em Saúde. R. C. C. S. tinha salário de R$ 4.427,50, extensão
de jornada no mesmo valor e ainda recebe um “prêmio” de R$ 1.328,28,
totalizando R$ 10.183,25. Na prefeitura de Brumadinho ninguém tem um salário
tão alto. Esse salário só não é maior do que o do prefeito, que é em torno de
17 mil reais mensais. O cargo é de 20 horas e “Extensão de Jornada” realmente
existe na Saúde. O problema fica por conta de quem consegue fazê-la: como não
há critérios legais claros no art. 39 da lei 1777/2010, quem decide os
servidores que terão ou não a extensão de jornada é o Secretário da Saúde, que
pode aceitar os pedidos apenas dos “amigos” e aliados.
No caso do “prêmio”
de R$ 1.328,28, conforme registramos anteriormente, não foi encontrada nenhuma
legislação que permita à Administração o pagamento dessa verba a servidores que
não sejam do quadro da Educação.
Salários iniciais
também irregulares
Analisando as
páginas da Folha de Pagamento vê-se que os problemas são muitos. Outro que não
foi apresentado na denúncia é o salário inicial dos contratados. Os contratos por tempo determinado são, a
rigor, ilegais nos termos do art. 37 da Constituição Federal. Ainda assim,
quando são feitos, como é o caso de em torno de 1.000 servidores em Brumadinho,
as pessoas só devem ser contratadas no nível inicial do cargo, conforme consta
do anexo II – Quadro Permanente de Pessoal da Lei 1.777/2010, Plano de Cargos e
Carreiras. No entanto, são inúmeros os casos em que as pessoas foram
contratadas dessa forma precária mas tiveram seus salários “engordados” logo na
contratação. Como não são do Quadro Permanente, eles não têm carreira, e ,
portanto, não podem ser contemplados pela Lei 1.777/2010, Plano de Cargos e
Carreiras. Só poderiam ser contratados com salários do nível inicial dos
cargos, ou seja, na posição vertical I.
No entanto foram mais de 20 casos de contratados nos níveis II, III e
IV, apenas das páginas analisadas por nossa reportagem. Exemplos são os cargos
de Assistente Técnico II, Assistente Técnico III, Agente Condutor IV,
Assistente Técnico IV e Agente Administrativo IV. Nesse último caso, o salário
fica em 68% maior do o Nível I.
Confusão: Prefeitura admite erros, publica
portaria, volta atrás, publica outra portaria e contra-ataca, prometendo
investigar governo anterior
No dia seguinte da entrega das denúncias na
Câmara, a Prefeitura não se moveu para dar alguma explicação à população.
Apenas cinco dias depois, tomou alguma atitude. O Prefeito publicou, no dia 18,
a Portaria GP N.º 008/2014 em que afirmava que a denúncia fora feita pela
Secretária Municipal de Administração, Valéria das Dôres Moreira. O objeto da Portaria
não eram as denúncias em si, mas o questionamento dos documentos entregues à
Câmara. Dizia o Art. 1º da Portaria:
“Art.1°. – Considerando denúncia
formalizada pela servidora Valéria das Dôres Moreira, ocupante do cargo de
Secretaria Municipal de Administração, DETERMINAR a instauração de SINDICÂNCIA
ADMINISTRATIVA INVESTIGATORIA para apurar ocorrências que envolveram a retirada
de documentos de arquivo físico/eletrônico da prefeitura municipal de
Brumadinho, sem requerimento e autorização de autoridade competente ou dos
interessados.”
Ao não negar os pagamentos das
gratificações, formar uma “Comissão de Sindicância” apenas para apurar quem
repassara as informações, o Governo Municipal acabou por admitir o pagamento
das gratificações ilegais como também faria mais tarde o Vereador Wanderlei
Xodó (PV) na Tribuna do Legislativo.
No Art.5°, o Prefeito determinou o tempo
dos trabalhos: “A comissão, ora constituída, terá o prazo de 30 (trinta)
dias, a partir da data de publicação desta portaria, para concluir a
apuração dos fatos, podendo esse prazo ser prorrogado por igual período se
necessário.”
Nova Portaria “manda recado” para Governo
anterior
Oito dias depois, véspera da reunião da
Câmara que votaria pela aceitação ou não das denúncias, o Prefeito Brandão
(PSDB) fez nova publicação, a da Portaria GP N.º 020/2014. Dessa vez o Prefeito
Brandão (PSDB) informou que a denúncia fora feita por Morais. Curiosamente, o
Prefeito Brandão incluiu na Portaria supostas irregularidades que não foram
tratadas pelo denunciante, mas que ficam muito visíveis quando da análise da
documentação, o pagamento de horas extras e “outras verbas”.
Outra novidade na segunda portaria soou com
o ameaça aos apoiadores do ex-prefeito Nenen da ASA. Aliados do ex-prefeito
estavam usando as redes sociais para convocar a população para ir à Câmara
pressionar os vereadores para aceitarem o pedido de investigação. Ainda pela
rede, pressionavam os vereadores. Na segunda Portaria GP N.º 020/2014, Brandão
determinou a apuração também de horas extras do Governo anterior, apesar de
isso também não constar na denúncia entregue à Câmara.
Dizia o Art. 1º:
“Art. 1.º - Considerando denúncia
formalizada pelo Ex Servidor Guilherme Braga Morais, acerca de
pagamentos indevidos de gratificações, e horas extras junto à Câmara
Municipal, e ao Ministério Público, sendo por este último dada ciência a esta
administração, DETERMINO a instauração de SINDICÂNCIA ADMINISTRATIVA
INVESTIGATÓRIA para apurar a veracidade e a legalidade dos fatos relativos
ao pagamento de gratificações, horas extras e outras verbas, nos períodos de
2009/2012 e de 2013 até a presente data.” (os grifos são do jornal)
Agora, com mais serviço – apurar as horas
extras do Governo anterior – a Comissão terá mais tempo, se antes deveria
trabalhar até 18 de dezembro, agora terá prazo até 25 de janeiro de 2015,
podendo ser estendido; diz o artigo:
“Art. 5.º - A Comissão, ora instituída,
terá o prazo de 60 (sessenta) dias, a partir da data da publicação da Portaria
de sua nomeação, para concluir a apuração dos fatos, podendo esse prazo ser
prorrogado por igual período se necessário.”
Prefeitura divulga “Nota de esclarecimento”
mas não nega acusações
No dia 25 de novembro, quase duas semanas
depois das denúncias feitas ao Legislativo, Prefeitura Municipal de Brumadinho
publicou nota em seu endereço eletrônico e na reder social facebook. Mais uma
vez a Prefeitura não negou nenhuma das acusações, nem sobre o pagamento das
gratificações e nem sobre o fato de se engar a prestar informações aos
vereadores. A nota se limitou a acusar o Denunciante e a dizer que estavam
“sendo tomadas as medidas administrativas, policiais e judiciais cabíveis,
relativas às informações pessoais de servidores, divulgadas de forma ilegal no
município, para elucidação da retirada indevida de documentos de servidores
municipais, sem autorização judicial ou dos interessados”. Apesar de uma das
acusações ser a negativa de prestar informações ao Legislativo Municipal desde
o início do mandato, a Prefeitura garante que tem “COMPROMISSO com a
TRANSPARÊNCIA DAS AÇÕES DO GOVERNO”. Em nenhum momento da Nota, a administração
de Brandão (PSDB) afirma que fará cessar as ilegalidades ou que esse seria o
horizonte de suas ações.
Denúncias são
apresentadas também ao Ministério Público de Minas Gerais
A mesma denúncia
que foi apresentada à Câmara de Vereadores também foi apresentada por Guilherme
Augusto Braga Morais ao Ministério Público de Minas Gerais em Brumadinho. Isso
foi feito na data anterior, 12 de novembro. Além de constar da documentação
entregue ao Legislativo, a própria Administração corrobora a informação. Em sua
“Nota de esclarecimento” a Prefeitura garantiu que “todas as informações a respeito
de pagamentos de seus servidores estão sendo disponibilizadas ao Ministério
Público”. Na Portaria de 26 de novembro, art. 1º, registrou que o MP já dera “ciência
a esta administração” sobre o recebimento da denúncia.
Vereadores
recusam-se a investigar as denúncias
Art. 31. A fiscalização do Município será
exercida pelo Poder Legislativo municipal, mediante controle externo, e pelos
sistemas de controle interno do Poder Executivo municipal, na forma da lei.
Foi uma noite de
chuvas e trovões. Palmas e vaias. A Câmara lotada, parecia posse de prefeito e
vereadores. “Barraco”, estouro de bomba, correria, Polícia Militar chamada às
pressas. E não faltou o tradicional “bate-boca” entre as torcidas. Tudo fotografado
por câmeras e celulares. E filmado: pelo menos duas filmadoras foram instaladas
para o registro do evento.
A reunião do
Legislativo teve início na noite de 27 de novembro, mas só terminou no dia
seguinte. Só de inscritos para a tribuna eram 12, mas uma desistiu.
Discussão
acirrada, vaias e palmas
Entre os
inscritos para a Tribuna, antes mesmo de a denúncia entrar em pauta, três eram
vereadores. Os outros nove eram pessoas citadas na denúncia, pessoas não
citadas na denúncia mas que tiveram seus nomes veiculados publicamente,
parentes dos citados em panfletos anônimos, apoiadores da investigação e
aliados do Prefeito contrários à investigação.
Um senhor chamado
Mauro Fernando, pregoeiro da Prefeitura, recebeu muitas palmas de quem foi lá
pressionar contra a investigação, quase todos servidores municipais, boa parte
exercendo cargos de chefia. Mauro Fernando defendeu que o governo é
transparente, citando os pregões e a fiscalização da Câmara, mas não negou as
acusações.
A Prefeitura
optou pela linha de defesa de que as provas eram ilegais, como fez também o
vereador Hideraldo Santana (PSC) em sua declaração de voto contra a apuração,
embora o próprio vereador saiba que, no que respeita a outra denúncia – recusa
do Prefeito em prestar informações à Câmara –, não havia nenhum questionamento
sobre a legalidade das provas. Ele mesmo, nos dois últimos anos, acompanhou as
negativas da Prefeitura em prestar as informações e até votou o mesmo
Requerimento mais de uma vez, sabendo que o Prefeito não tinha cumprido a Lei.
A defesa da Prefeitura não quis discutir o mérito das gratificações.
Já o vereador
Itamar Franco, suplente que assumiu a vaga deixada pelo Secretário Carlos
Mendes (PDT), do mesmo partido do Prefeito (PSDB), gastou quase todo seu tempo
lendo uma nota de esclarecimento publicada meses atrás pela Presidente da
Câmara, Renata Parreiras (PSB). O discurso de Franco, não o Lacerda, mas o
Itamar, foi para questionar a postura de Parreiras, se se ela fosse a autora da
denúncia e não Guilherme Morais. Ainda que Renata Parreiras, reconhecidamente
de oposição, tenha supostamente colaborado na confecção da denúncia, ali ela
estava apenas cumprindo sua obrigação de colocar a denúncia recebida em
discussão, como manda a Lei.
Vereador admite
que recebe “gratificação”
Conhecido por ser
de muito poucas palavras, o vereador Vanderlei Rosa de Castro, o Xodó (PV),
único vereador do mandato anterior que conseguiu se reeleger, foi à Tribuna.
Num discurso bastante inflamado, defendeu sua situação e da esposa, que é
diretora na escola municipal de Tejuco. Xodó explicou que recebe mesmo a
gratificação porque faz horas extras e às vezes tem que se levantar as cinco da
manhã para levar pacientes em BH (ele presta serviços na Secretaria de
Governo). E que às vezes chega em casa às 18 e 30 horas. Ao que ficou
parecendo, o vereador não deve ter sido orientado, a acabou por confessar que
as gratificações, pelo mesmo a sua, são ilegais. Como ele mesmo explicou na
Tribuna, ele presta horas extras. As gratificações só podem ser dadas, “por
tempo determinado”, “por encargos
eventuais”, quando o servidor “assumir atribuições que não se incluam em seu
desempenho regular”, como diz a Lei 39/2004. Como ele, segundo declaração do
próprio vereador, continua apenas fazendo sua função de motorista, não pode
receber gratificação por isso.
“Sobre ratos,
ratazanas e Gratificações ilegais na Prefeitura Municipal de Brumadinho”
Já o vereador Reinaldo Fernandes (PT) fez
um discurso intitulado “Sobre ratos, ratazanas e Gratificações ilegais na
Prefeitura Municipal de Brumadinho”. O vereador condenou veementemente as
pessoas que nos últimos dias tinham distribuídos panfletos anônimos no
Município. Chamou-os de “gente covarde, que não assume o que escreve, gente
criminosa”, explicando que o art. 5º da Constituição Federal garante a todos a
“livre expressão”, mas que “veda a anonimato”, que é crime.
Os panfletos anônimos já tinham sido
repudiados por várias pessoas que tinham usado a tribuna. Fernandes foi o
último a falar. O vereador disse que nos panfletos anônimos “não aparecem
apenas os nomes dos envolvidos em corrupção, aparece também o nome de quem não
tem nada a ver com os atos de corrupção, mas tem seu nome envolvido por um
covarde, um criminoso, uma criminosa que faz panfletos anônimos”. O vereador do
PT conclamou os presentes a não acharem graça nenhuma em panfletos e cartas
anônimas, “uma praga na cultura de Brumadinho”, segundo ele. “Não leiam, não
divulguem, não achem graça! Conheço muita gente boa que acha graça em cartas e
panfletos anônimos”, disse Reinaldo Fernandes. “Mas não achem! Porque hoje eles
colocam o nome de alguém de quem você não gosta, do seu inimigo político, mas
amanhã ele vai colocar o seu, de sua mãe, de seu pai, sua filha, de seus
parentes” alertou o vereador. Fernandes disse que, em sua opinião, quem produz
e distribui panfletos anônimos “por sua atitude, se afasta de sua condição de
ser humano, criado à imagem e semelhança de Deus, e, por causa disso, acaba se
assemelhando muito a um rato”. E fez sua saudação final: “Boa noite às duas
torcidas, quer dizer, a todos! E vamos pro jogo que há ainda muito jogo pela
frente!”
Vereador Reinaldo Fernandes (PT) discursa sobre "Ratos, ratazanas e gratificações ilegais na Prefeitura" |
Barracos, bomba e
Polícia
Às 20:55 hs o
clima se acirrou tanto que a reunião teve que ser interrompida. Uma senhora, ao
ouvir a frase “Mensalão do Brandão”, iniciou um tumulto e a Polícia Militar foi
chamada.
Às 21:45,
estourou uma bomba ao lado do Plenário, e, novamente, a reunião foi
interrompida.
Denúncia é
rejeitada pelos vereadores
Já deveriam ser
mais de onze da noite quando a proposta foi colocada em votação. A votação foi
nominal: cada vereador era chamado para dize se era contra ou a favor de
receber a denúncia par ser investigada. Quando dizia que era contra, recebia os
aplausos da torcida de Brandão e se votava a favor da investigação, as vaias,
embora o vereador Reinaldo não tenha sido vaiado. Apenas quatro vereadores
votaram favor de receber a denúncia: Alessandra Oliveira (PPS), Lucas Machado
(PV), Renata Parreiras (PSB) e Reinaldo Fernandes (PT).
Fizeram
“declaração de voto” os vereadores Betinho (PROS), Hideraldo Santana (PSC),
Lucas Machado (PV) e Alessandra de Oliveira (PPS) e Reinaldo Fernandes (PT).
Lucas Machado disse que se a Câmara recebera uma denúncia, assinada, com
documentação pessoal do denunciante, que assinou a denúncia, a obrigação da
Casa era apurar, e por isso votara a favor da investigação.
O Vereador
Helbert Firmino, contrário porque entendia que o pagamento das gratificações
eram legais, com “autorização expressa pelo Estatuto dos Servidores Públicos de
Brumadinho, não havendo portanto ilegalidade e justificativa para recebimento
da denúncia”.
Alessandra de
Oliveira disse que a Câmara tinha a “obrigação de apurar todas as demandas
apresentadas pelo povo de Brumadinho.”
Já Reinaldo
Fernandes disse que era uma situação chata, que envolvia inclusive amigos seus
que são da Administração Municipal, lembrou aos presentes que eles sabiam que
ele, Reinaldo, apoiara o candidato Brandão, de quem é amigo, mas, como
vereador, fora eleito para exercer a função, e que, uma delas, é a de
fiscalizar o Executivo. Disse que as denúncias eram preocupantes e que tentara
resolver a questão de outra forma. Relatou que se reunira com o Governo e que
fizera duas sugestões para resolver o problema: que o Governo tomasse uma
atitude imediata para cessar as irregularidades, se é verdade que elas existem;
e que, se fossem constatadas irregularidades, que o Prefeito determinasse a
devolução do dinheiro pelos servidores que receberam a mais, de forma
parcelada. O vereador disse que não recebeu nenhum retorno do Governo. Terminou
dizendo que lamentava incomodar os amigos que fazem parte do Governo Municipal,
mas, como o Governo não tomara nenhuma atitude concreta, ele, Reinaldo, se via
obrigado a acatar a denúncia. “Como vocês viram, quando eu votei já sabia do
resultado, sabia que eu já era voto vencido, mas creio que eu não posso ser,
nem oportunista, nem omisso, e nem hipócrita”, terminou ele.
Assim que foi
feita a votação e a denúncia rejeitada, a Câmara se esvaziou, ficando apenas
parte da plateia.
Moção pela
conquista da Copa do Brasil
Numa reunião que durou mais de cinco horas,
em apenas um dos momentos houve um clima mais ameno. Foi quando foi votada a
“Moção de Congratulação” apresentada pelo vereador Reinaldo Fernandes
(PT). A Moção parabenizava o Clube
Atlético Mineiro, “Galo Doido”, como dizia a Moção, pela conquista inédita da
Copa do Brasil. “O mérito dessa moção”, disse Fernandes sorrindo, “é que agora
eu consegui juntar as duas torcidas aqui reunidas”. Foi o momento em que havia
atleticanos tanto do lado do que defendiam Brandão quanto do outro lado. Nessa
hora o auditório ficou descontraído, e nem mesmo os vereadores cruzeirenses que
votaram contra a moção foram vaiados.
Quem é Guilherme Morais
O jovem, de
apenas 21 anos, foi aliado do ex-prefeito Nenem da Asa (PSDB) mas abandonou-o
no início da campanha política, passando a apoiar intensamente o atual
prefeito, Antônio Brandão (PSDB), liderando a ala jovem que apoiava a
candidatura. Assim que Brandão tomou posse, passou a integrar o governo, ao
lado do vice-prefeito, Breno Carone, seu companheiro de partido, PMDB. Pouco
meses depois deixou o governo junto com o ex-prefeito, que foi praticamente
expulso da Prefeitura. Quando Carone assumiu a presidência do Consórcio da
Bacia do Rio Paraopeba – CIBAPAR -, Guilherme Morais foi trabalhar com
ele.
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