Edição 111-Março/2010
Moradores se mobilizam contra Aterro Sanitário
Eles reclamam da falta de fichas para atendimento no Posto de Saúde, da falta de acesso aos bairros na época de chuva por causa das ruas de chão; do transporte escolar que faz as crianças andarem muito; do descuido com o campo de futebol e da falta de lazer; da falta de água tratada; de serem tratados como “forasteiros” pela Prefeitura. Como se não bastassem tantos problemas, a população do Parque da Cachoeira, Parque do Lago e Parque Jacarandá considera que tem mais um problema: a construção do aterro sanitário na comunidade. São em torno de 550 famílias, aproximadamente 1.000 moradores.
Eles já foram à Câmara – no dia 25 -, fizeram uma passeata em Brumadinho no dia 26 de março, enviaram documentos para o Ministério Público Estadual, para deputados em Brasília, na reunião do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente – CODEMA – mas reclamam de não estarem sendo ouvidos.
O aterro
A reportagem do de fato conversou com Silas de Paula e Maria Aparecida Fernandes, a Lúcia. Apesar de não serem da Diretoria da Associação de Moradores local, são duas das pessoas que estão na luta contra a construção do Aterro Sanitário. Segundo eles, o aterro será construído em uma área onde há várias nascentes, fauna e flora muito diversificada e haverá desmatamento de uma área enorme, 15.000 m². “A prefeitura diz que foram seis lugares procurados. Se tem que desmatar, não é o lugar adequado”, reclama Silas de Paula. Em panfleto distribuído aos moradores de Brumadinho, eles questionam: “Para onde vão os nossos tucanos?”Ainda segundo eles, o local está a menos 320 metros de uma das moradias, o que seria prejudicial à família.“
Sem conversa
A principal reclamação dos moradores é a falta de transparência da Administração de Neném da ASA (PV). Segundo Lúcia, eles ficaram sabendo da construção do aterro por acaso porque as obras tiveram início. “Aconteceu uma reunião aqui, mas eles não querem conversar, disseram que vão construir e pronto”, reclama Lúcia. Segundo eles, a reunião aconteceu no início do mês, com presença de diversos secretários, como o de Meio Ambiente, da Fazenda, de Obras e de Governo e uma “psicóloga”. Os dois reclamam que havia um tom agressivo na reunião por parte dos secretários, especialmente o Secretário de Governo e irmão do Prefeito, Alcimar Barcelos, o Cid. “O prefeito mesmo não veio! Prometeu proteger o meio ambiente durante a campanha, preservação das nascentes e agora não vem conversar com a comunidade”, lamentam.
Sobre a reunião no CODEMA, Silas diz que eles solicitaram a documentação sobre o aterro e que o CODEMA alegara que ela estaria coma Secretaria de Meio Ambiente - SEMA. Já a SEMA pedira uma semana par reunir os documentos. “Eles oferecem os documentos mas não explicam nada pra gente”, reclamam.
A outra preocupação dos oradores é quanto à quantidade de lixo. Segundo Silas e Lúcia, eles teriam lido em um jornal que o aterro atenderá não apenas a cidade de Brumadinho como muitas outras cidades vizinhas, mas não souberam precisar para a reportagem do de fato qual era a fonte da informação.
Como a localidade possui uma associação de moradores, a ACOPAPA, nossa reportagem quis saber qual o envolvimento dela na luta contra a construção do aterro. “Ah, a dona Dilma e o Sr. Geraldo não são nem contra e nem a favor”, disseram eles. Reclamaram ainda da diretoria da Associação, afirmando que ela (referindo-se à Sra. Dilma) “não divulga as coisas”. Eles não sabiam, por exemplo, que a Prefeitura vai repassar R$ 73.000,00 (setenta e três mil reais) para a Associação.
Agora a comunidade aguarda uma Audiência Pública na Câmara Municipal, onde esperam ter respostas para suas inúmeras dúvidas.
Outro lado
Em contato com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente - SEMA - a reportagem do de fato fez uma série de perguntas ao Secretário Quintino Vargas Amaral.
Sobre a reclamação dos moradores de que a questão não foi discutida com eles, Quintino explicou que "a discussão com a população, fazendo-se necessária, deve acontecer durante o processo de licenciamento ambiental. Quando a atual gestão assumiu o governo municipal, o licenciamento ambiental do aterro sanitário já havia ocorrido e o empreendimento já possuía a Licença Ambiental de Implantação expedida pelo Conselho Estadual de Política Ambiental (COPAM). Assim, não sabemos informar se faltou ou não transparência da Prefeitura durante o processo de licenciamento ambiental. A documentação existente nos permite informar que não há indícios de encobrimento do projeto, uma vez que a área foi desapropriada de pessoa ainda hoje residente junto ao Parque do Lago, através de decreto municipal que especificou com clareza a sua destinação para aterro sanitário."
Quintino diz ainda que "deve-se levar também em conta que as atividades que serão desenvolvidas no aterro sanitário não interferem no bairro, uma vez que a área do aterro encontra-se na zona rural, em vertente oposta à do Parque do Lago, não possui acesso direto ao bairro e o transporte dos resíduos sólidos se fará pela Rodovia Municipal Brumadinho - Córrego do Feijão, externa ao bairro". O Secretário lembra da reunião que aconteceu no início de março, onde, segundo ele, a "Administração Municipal, representada por sete secretários e vários técnicos" se reuniu com os moradores "para prestar esclarecimentos sobre a implantação e operação do aterro sanitário".
Sobre o fato de o aterro ser também para cidades vizinhas, Quintino diz que "o projeto do Aterro Sanitário de Brumadinho, que foi elaborado por empresa contratada pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD), prevê que o aterro deverá atender os municípios de Brumadinho e Mário Campos. Entretanto, como Mário Campos não participou das ações visando à obtenção de crédito para a sua construção, o interesse daquele município em utilizar o nosso aterro sanitário dependerá do preço a ser estipulado por Brumadinho."
"Quanto a afirmar que moradia situada a essa distância (320m) é muito próxima ou não depende de vários fatores que foram analisados por ocasião do licenciamento ambiental do empreendimento." Quintino explica que o Art. 3º da DN 118/2008- Deliberação Normativa do Conselho de Política Ambiental - COPAM-, que fixa requisitos mínimos (inclusive distâncias) para a área de implantação e operação de depósitos de lixo, dispõe que tais requisitos deverão ser obedecidos, mas que isso, segundo a norma, apenas "até que seja implantado, por meio de respectivo processo de regularização ambiental, sistema adequado de disposição final". Segundo ele, se há esse sistema adequado, não há problemas. "A maioria das residências guarda ampla distância da área do aterro", defende o Secretário de Meio Ambiente. O Secretário acrescenta ainda que entende “que os requisitos exigidos pela DN 118/2008 são para depósitos de lixo do tipo aterro controlado. Considerando que este tipo de depósito não prevê a impermeabilização do solo e o recobrimento do lixo não precisa ser diário, há necessidade de exigências mais rígidas quanto às distâncias de cursos d'água e de núcleos urbanos.” Ele explica que, no caso de aterro sanitário, “além do estudo prévio da área (tipo de solo, geotecnia, etc), tem-se a impermeabilização do solo através de membranas (evitando-se a contaminação do lençol), o tratamento do chorume e o recobrimento do lixo no mínimo uma vez por dia.” Nesse caso, o Secretário entende que os afastamentos observados poderão ser menores e analisados durante o processo de licenciamento ambiental.
Fauna, Flora e Nascentes
Uma das maiores preocupações dos moradores diz respeito à fauna e à flora do lugar. Eles afirmam que o aterro será construído em uma área onde há várias nascentes, fauna e flora muito diversificada e haverá desmatamento de uma área de 15.000 m². Sobre isso, o Secretário explica que "a área onde está sendo implantado o aterro sanitário foi selecionada por equipe técnica contratada diretamente pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável e contém a mesma fauna e flora que possuía na época. O COPAM, em sua última reunião, autorizou a supressão da vegetação de acordo com o projeto licenciado. A área de supressão de mata é pequena, tanto em relação à área de pastagem que será utilizada para a implantação do aterro, como em relação à área de mata que será preservada." E se contrapõe à afirmação de que há nascentes: "o local de implantação do aterro sanitário não possui nascente e foi objeto de estudo geotécnico."
Quanto a escolha do Parque da Cachoeira, Amaral diz que "a escolha das áreas não coube diretamente à Prefeitura: foi feita através de levantamento técnico. O procedimento normal é selecionar cinco ou mais áreas que serão pontuadas com o uso de uma tabela de atributos (distância à sede do Município, qualidade das vias de acesso, tipo de solo, declividade, presença de água, vegetação, etc.). Será indicada a área que somar mais pontos.
Cabe ainda salientar que a liberação de recursos pelo Fundo Nacional do Meio Ambiente para elaboração do Projeto de Construção do Aterro Sanitário de Brumadinho deveu-se à aprovação de um plano, apresentado pela SEMAD, de melhoria da coleta e disposição final do lixo no entorno das unidades de conservação (no caso o Parque Estadual da Serra do Rola Moça). Por este motivo, as áreas selecionadas deveriam se localizar entre a Sede do Município e a localidade de Casa Branca."
Quintino contesta ainda outra informação dada pelos moradores, sobre a documentação. Segundo ele, "a documentação nos foi solicitada em 26/03/2010, durante a reunião do CODEMA, e foi entregue no dia 29/03/2010."
Comunidade faz manifestação
No último sábado, 3, moradores fizeram uma grande manifestação na estrada que passa ao lado do Parque da Cachoeira e leva à Vale. Às 11 horas, moradores fecharam a estrada, de um lado e do outro do trevo que sai para Tejuco. Em pouco tempo, de um lado e do outro, carros foram ficando parados e houve muita reclamação e bate-boca. Os manifestantes, revoltados, incendiaram pneus, galhos de árvores, capim, panos; e exibiram faixas contra o aterro, em defesa do meio ambiente. Tudo, ao som de palavras de ordem como “Não, não, não! Não queremos o lixão!”
Neném da ASA, Judas
Como era Sábado de Aleluia, dia tradicional em que os cristãos católicos fazem a queima simbólica de Judas Iscariotes, o traidor de Jesus Cristo, não faltou um “Judas”. No boneco, feito de pano, se lia: “Judas – Prefeito Nenem”. E os manifestantes gritavam, na hora que queimaram “Nenem da ASA”: “Judas, Judas, Prefeito traidor”. No bar do trevo, um morador discutia com os outros: “Viu, quem mandou vocês votarem nele! Eu falei que ele era um moleque!”, gritava, se referindo ao Prefeito.
Clima quente
Por volta das 11:30 horas, “o tempo fechou”. Um motoqueiro quis furar o bloqueio e foi impedido. Daí a pouco, um homem tentou entrar com uma camioneta e foi advertido por um dos moradores que não deveria. Mas, minutos depois, ele, que tinha deixado o veículo ligado, avançou pra cima das pessoas, furando o bloqueio. Consequência: foi seguido e teve os vidros de seu carro quebrado por parte dos manifestantes.
Chegada da PM e Bombeiros
Por volta das 11:40, uma viatura da PM chegou mas não agiu, apenas chamou reforço. Minutos depois, apareceram mais 3 viaturas da Polícia Militar, uns 15 policiais e o caminhão do Corpo de Bombeiros. Depois de muita negociação, conversas de um lado e outro, os bombeiros e PM apagaram o fogo dos pneus e a pista foi liberada, por volta de 12:30 horas. Ainda houve confusão porque o homem que teve seu veículo quebrado acusou um dos manifestantes, depois acusou outro e, no fim, ele e mais um rapaz – nãos e sabe se culpado – foram levados para o CERESP em Betim em uma viatura.
Os manifestantes ainda ficaram à margem da estrada, com suas faixas e suas palavras de ordem.
Para entender o caso
Em dezembro de 2008, o Governo Federal entrou em contato com a Prefeitura de Brumadinho, quando era prefeito Jayme Wilson (PSDB). O Governo Federal oferecia, através do PAC, Programa de Aceleração do Crescimento, mais de R$ 6 milhões ao Município para investimento em saneamento básico, no caso, a construção de um aterro sanitário. A vida útil do aterro controlado de Brumadinho está no fim. Com a oferta do Governo Federal, a Câmara Municipal deveria aprovar uma proposta de lei enviada pelo Executivo que lhe permitia receber o dinheiro, o que foi feito naquele mês. Depois disso, coube ao governo de Nenem da ASA (PV) executar a obra e prestar contas ao Governo Federal.
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