Edição 172 –
Março 2015
Opinião
Estadistas, Políticos e
Indignados na Corrupção de Todos Nós
Um problema do debate político atual é o maniqueísmo, no
caso, se não é contra a Dilma, só pode ser a favor. Não é meu caso: não apoio
as manifestação anti-PT e anti-Dilma, mas também não apoio o PT e o governo
eleito. Quando se analisa a história, descobre-se que às vésperas da emergência
de grandes ditaduras, tais como o nazismo, o fascismo, o stalinismo e até mesmo
o famigerado golpe militar brasileiro, a indignação contra a corrupção foi
usada por aproveitadores políticos para mobilizar as massas com promessas de
limpeza social e ética, no caso do nazismo, étnica também (judeus, ciganos,
comunistas e homossexuais seriam a banda podre a ser banida da sociedade).
A indignação contra a corrupção atualmente carrega várias
contradições. Porém, a maior delas é haver indignação com a corrupção das
empresas públicas, o que deve haver mesmo, e nenhuma indignação com todos
aqueles que fizeram e fazem do bem público um espaço para seus interesses
privados.
Vou
retratar alguns personagens reais, que foram para as ruas no dia 15 de março.
Eles são o retrato bem fiel da hipocrisia de muitos que tomaram a bandeira da
ética apenas agora neste momento da história política brasileira e o fizeram
com uma violência verbal e moral que não combina com a verdadeira democracia:
Gestor público corrupto - roubou até cansar como assessor na Prefeitura de Brumadinho,
teve que mudar de cidade porque a pressão social foi grande demais sobre si,
saiu magoado e se dizendo injustiçado, mas sem ser processado e com o bolso cheio.
Foi para as ruas com mensagens muito mal educadas de revolta contra a
corrupção;
Traficante de Influência Política - conseguiu um emprego público no judiciário sem concurso para a
esposa, que trabalha meio horário e não parece ser uma funcionária motivada,
dedicada e eficiente;
Empresário Corrupto - dono de uma pequena indústria, vive dizendo que a ditadura não
foi barra pesada (seriam invenções da esquerda) e compra fiscais porque diz que
no Brasil só assim se consegue tocar um negócio para a frente;
Diretor de Empresa Mafioso - sabe de vários esquemas de corrupção de uma grande empresa na
qual trabalhou, cheia de recursos e muito bem organizada para fazer valer seus
interesses junto aos políticos, mas acha um absurdo os apoiadores da Dilma, em
especial o MST, ir para as ruas de forma organizada;
Ex-Cara Pintada Fã da Ditadura - foi
para as ruas contra Collor. Já se formou faz bastante tempo, mas tem
carteirinha falsificada de estudante e acha que a solução é o exército voltar
para as ruas. Esqueceu que na ditadura houve muita corrupção também e que
ninguém podia reclamar dela abertamente;
Eleitor Indignado Seletivo - votou em deputados fisiológicos, com propostas pífias e por
motivos privados (família vota, amigo de beltrano, vai arrumar emprego para
fulana, etc.); deputados que aumentaram a verba indenizatória em Minas Gerais.
Está indignado com a corrupção do governo federal. Já em relação à cara de pau
do deputado em quem votou, nem toca no assunto.
Democracia representativa se consolida com democracia
participativa forte, através das manifestações das ruas, mas principalmente da
ação cotidiana, articulada, discutida livremente, respeitosamente e
exaustivamente nos fóruns e conselhos de políticas públicas. Sem que as ruas de
2015 virem ações cotidianas de democracia participativa, as reivindicações
podem virar farofa como as de 2013. Há uma série de ONGs que discutem e
implementam ações concretas de combate à má gestão pública e a corrupção. Elas
precisam de pessoas efetivamente indignadas, no cotidiano e não apenas de vez
em quando, para apoiarem as ações que desenvolvem.
Democracia forte se faz não com hipocrisia, virulência
verbal, assédio moral e debates insanos entre os que acham que defendem o bem
contra aqueles que supõem ser a encarnação do mal. Democracia se faz com
profundo respeito a quem tem ideias opostas às suas. Essa é uma das diferenças
entre grandes estadistas e políticos. Estadistas reconhecem o direito e o
mérito em seus opositores políticos e lutam politicamente contra eles para vencerem
eleições baseadas no livre debate público. Não atuam para desqualificar o
opositor, mas sim mostrar que as ideias e propostas de mundo e sociedade que
defendem são melhores. E é nesse sentido que se percebe que vamos de mal a
pior, pois nem no governo nem na oposição conseguimos encontrar verdadeiros
estadistas. E essa corrupção é de todos nós. Não ainda querer dizer que essa
corrupção é dos outros. É de toda a sociedade e a política brasileiras.
Armindo dos Santos de
Sousa Teodósio (Téo), Professor do Programa de Pós-Graduação em
Administração da PUC Minas
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