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quarta-feira, 20 de abril de 2016

Edição 184 – Março 2016
Opinião

O Curso da Reforma Ética

Há razão para a adoção de soluções radicais na política? Quem está colocando a ética como baluarte do país promete tudo mudar de forma rápida. Infelizmente, essa indignação muda pouquíssima coisa e perpetua o que temos de pior em termos de ética no processo político.
Presenciamos hoje uma incapacidade de conviver com o pensamento político oposto. Pior ainda é a incapacidade de propor um projeto de futuro. Além da limpeza ética, qual outra proposta de país está sendo colocada? Nenhuma! Os grupos políticos, sobretudo a oposição, sucumbiram ao moralismo de propor a limpeza ética e não são capazes, como já foram a algum tempo atrás, de propor uma visão de futuro para o país, baseada em um pacto social para distribuição de riqueza e bem-estar. O que está sendo oferecido é demagogia e ódio político, que em muitos casos resulta também em inimizades no âmbito pessoal. Ou será que alguém acredita que basta limpar o país para que tudo se resolva como em um passe de mágica!? Trabalho, renda, proteção ao meio ambiente, qualidade de vida, boa educação e saúde para todos, tudo viria depois da limpeza ética!? Quanta ingenuidade! E, em muitos casos, quanta hipocrisia!
Não estamos fazendo uma leitura mais profunda da corrupção que verseja em nossa sociedade. Multiplica-se a visão distorcida de pensar que quando formos como os EUA, tudo estará resolvido. Outro equívoco, geralmente defendido por quem tem curso superior, é imaginar que quando todos os brasileiros tiverem melhor educação, teremos um país melhor e sem corrupção. Como se a corrupção, a intolerância e o descaso com o espaço público não fossem também fortes e evidentes entre os bem nascidos e bem educados, como se fosse uma peculiaridade do Brasil, sempre pior do que os EUA, e dos pobres pouco letrados, sempre piores dos que estudam e trabalham em bons empregos.
Trata-se de um total desconhecimento histórico pensar que toda sociedade acima do Equador (americana e europeia) não teve e não tem corrupção e possui instituições melhores que as nossas. Desconhecimento de não perceber que a história do capitalismo americano é cheia de falcatruas envolvendo políticos e empresários, que perduram até hoje, por exemplo, na indústria bélica. O mesmo no socialismo da extinta União Soviética, se perpetuando na pseudodemocracia russa atual, dominada pela aliança entre máfia, políticos e empresários. O tão admirado Japão, suposto modelo de moralidade pública, também foi marcado nos anos 90 pelos escândalos denunciando a conexão entre corporações, governo e a Yakuza (máfia japonesa). E a China, modelo de crescimento econômico, vez ou outra, executa um corrupto. No sonho ódio político grandiloquente e ingênuo de alguns, bastaria estabelecer a pena de morte para se eliminar a corrupção.
Infelizmente, corrupção é uma mazela que nenhuma sociedade conseguiu erradicar em definitivo. Corruptos são executados desde a Roma antiga. Depois da "Operação Mãos Limpas" na Itália, que foi a grande inspiração de Sérgio Moro para a "Lava-Jato", a corrupção voltou a crescer e se tornou mais difícil de combater, pois as formas de crime se sofisticaram. O demagogo Berlusconi, através de um discurso moralista, chegou à presidência italiana. Anos depois, descobriu-se que esse moralismo fazia coro com os corruptos. O juiz que comandou a operação na Itália entrou para a vida política e se mostrou um político incapaz, um grande fiasco. Em síntese, sofisticou-se a corrupção e abriram-se as portas para demagogos, corruptos e incompetentes na política.
É importante lutar contra a corrupção? Sim. Claro. Corrupção é intolerável em qualquer lugar do mundo, praticada por quem quer que seja. Então, como combater a corrupção? Não é o ódio político e a revolução (mudança abrupta) que trazem soluções eficientes e duradouras no combate à corrupção, mas sim a inteligência, o trabalho contínuo, o compromisso com o interesse público para além de manifestações esporádicas e a reforma das instituições republicanas. A ruptura das instituições, sobretudo a democracia e o direito, não trazem resultados consistentes na luta contra a corrupção. Os estudiosos do caso italiano dizem que melhor seria ter combatido cotidianamente a corrupção, sem estardalhaço na mídia e sem ações abruptas. Ou seja, exatamente o oposto do que faz Sérgio Moro atualmente.
A mudança vem do trabalho sistemático e constante de transformação de nossas instituições, através da ação de longo prazo de organizações da sociedade civil capazes, políticos corretos (há muitos como em qualquer lugar do mundo), empresas comprometidas com causas sociais e cidadãos dedicados ao interesse público. Controle de contas públicas, transparência de gastos públicos, judiciário independente, polícia eficiente, redução das desigualdades, imprensa livre e democracia consolidada através de eleições regulares e do embate civilizado entre ideias opostas, constituem as alavancas para o combate à corrupção. Em vários desses quesitos o Brasil avançou enormemente, antes e também durante o governo atual.
A reforma ética de nossas instituições já está acontecendo há décadas, desde a redemocratização do país. Ela está tornando nossa sociedade mais capaz de combater a corrupção. Dizer que hoje existe mais corrupção é outro grande equívoco, pois na ditadura militar pouco ou nada podia ser denunciado e investigado, quanto mais punido. O combate à corrupção não consegue avançar sem democracia e respeito aos ritos do direito. Atualmente, Judiciário e Polícia Federal gozam de autonomia, recursos e liberdade nunca vistos para investigar, indiciar e julgar. A imprensa nunca foi tão livre para expor o que deseja.
As soluções e caminhos de transformação da sociedade são de longo prazo, lentos e tortuosos, exigindo dedicação e atenção constantes da sociedade e não apenas em momentos de crise política aguda. Quem ainda duvidar de tudo o que escrevi, pense na política em Brumadinho e veja em quantas "canoas furadas" já entramos, com políticos que prometiam moralizar a prefeitura. Nunca a moralizaram efetivamente e ainda nos premiaram com incompetência e má gestão.

Armindo dos Santos de Sousa Teodósio (Téo)

Professor do Programa de Pós-Graduação em Administração da PUC Minas

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